A modinha como expressão nacional do século XIX: desmistificando a aura de gênio do Padre José Maurício Nunes Garcia
DOI:
https://doi.org/10.11606/issn.2447-7117.rt.2020.174410Palavras-chave:
Modinha, Gênio romântico, Padre José Maurício Nunes Garcia, Popular-tradicionalResumo
A figura do gênio romântico, atormentado e incompreendido, que morre na miséria, tem acompanhado o fluxo de mistificação histórica desde o século XVIII, na figura de Mozart. Transladado para os trópicos, esse personagem foi personificado em José Maurício Nunes Garcia, compositor negro da Corte de D. João VI no Brasil, que teria Marcos Portugal como rival e antípoda – o Salieri de Portugal/Brasil. Por meio de uma pesquisa que analisou todos os Jornais de Modinha publicados em Lisboa de 1792 a 1796, e as Modinhas Imperiais que vieram a prelo pelas mãos de Mário de Andrade em 1930, pudemos perceber, entretanto, que o gênero modinha, cultivado por José Maurício em pelo menos quatro peças sobreviventes, possui elos motívicos que podem caracterizá- lo como pertencente a uma nacionalização incipiente da música brasileira. A partir dessa premissa foi possível traçar um perfil do Padre que desmistifica a aura do gênio, já que suas modinhas, em específico “Marília, si me não amas…”, trazem elementos que remontam à tradição popular oral brasileira. A Modinha, gênero que ressoaria em suas próprias missas para constituir uma brasilidade em música, não seria antes um gênero aglutinador de influências folclóricas e populares urbanas, e o fato de José Maurício compor nesse estilo não o aproximaria das correntes tradicionais de retórica neo-trovadoresca?
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