Chamada - Dossiê "Quando o assunto é a morte"
Chamada para submissões (v. 22, n.1)
Dossiê: Quando o assunto é a morte
Submissões até 1 de outubro de 2022
A morte é algo que nos ronda. A única certeza que persiste. Uma companheira silenciosa, uma iminência; sombra ou impulso para seguirmos caminhando inevitavelmente ao seu encontro, mais ou menos espantados. Mesmo quando ela nos assombra, nos sonhos, nas tristezas e nos medos, ela é intangível. Quando se aproxima, levando consigo um dos nossos, é quando ela se faz mais presente. Ela se faz sentir por instalar ao nosso redor ausências, buracos, brechas; ela se consuma pelas faltas. A inevitabilidade da morte é o que garante, por outro lado, o sentido às nossas ações laboriosas, aos nossos esforços e às nossas criações artísticas.
Nos últimos anos, contudo, a morte tomou proporções descomunais, alastrando-se por toda parte e intensificando sua colheita. Ela sai da dimensão da singularidade e torna-se plural, múltipla, social. Ela passa a atuar em grande escala e em dimensão global, tornando-se sincronicamente presente por todo o mundo, chamando a atenção para ausências e destruições. Como nos lembra Bauman (O mal estar da pós-modernidade, 1998, p.199): “assim banalizada, a morte torna-se demasiado habitual para ser notada e excessivamente habitual para despertar emoções muito intensas. Seu horror é exorcizado pela sua onipresença, tornado ausente pelo excesso de visibilidade, tornado ínfimo por ser ubíquo, silenciado pelo barulho ensurdecedor”.
Seus efeitos geram visões difíceis de esquecer, por isso necessárias para que saibamos refletir sobre nossas vidas singulares e sobre o momento histórico que vivemos. As imagens da morte são testemunhos, provas de acontecimentos reais que não podem ser esquecidos. São marcas impressas em cada um de nós, no presente, capazes de garantir a projeção do que está por vir.
Com acontecimentos recentes em decorrência da pandemia, nossos olhos e mentes ficam marcados pela visão de valas sendo abertas com escavadeiras, filas de pessoas para serem atendidas e relatos de pessoas morrendo em casa, sem assistência médica. Em nosso país, ainda lidamos ao mesmo tempo com o extermínio de populações marginalizadas, como um projeto sistêmico, estrutural: "se consideramos a política uma forma de guerra, devemos perguntar: que lugar é dado à vida, à morte e ao corpo humano (em especial o corpo ferido ou morto)? Como eles estão inscritos na ordem de poder?" (MBEMBE, Necropolítica, 2016, p.124).
Nos últimos anos, a morte tomou proporções inimagináveis, suprimindo inclusive os rituais de despedida: sem cortejo, sem vela, sem reunião de pessoas para dizer um último adeus. A morte passa a figurar como um apagamento, similar a um jogo no qual personagens são automaticamente suprimidos da tela. Uma banalização da morte nos acomete e a morte passa, então, a não ser mais processada.
Diante desse cenário de apagamentos e extermínios em massa, como se comportam as artes da cena? Como a cena se ergue, persiste, responde ou reage a essas tensões? Sabemos ou podemos vislumbrar que efeitos esse momento histórico promove na cena contemporânea? Como a cena se compõe a partir ou inebriada pela ausência, pelas sombras, pelo vazio e pelo silêncio? Conseguimos de algum modo reverenciar nossos mortos? A presença maciça de telas e projeções evocaria um efeito de presença daquilo que não há mais?
Buscando tensionar esse momento histórico, a fim de fomentar a reflexão sobre os sentidos e causalidades da morte na cena contemporânea, propomos o dossiê Quando o assunto é a morte. Encorajamos a submissão de textos dentro desta proposta, podendo ou não estar relacionados aos tópicos apresentados a seguir:
- A morte, seus efeitos e suas causalidades em diferentes acepções da criação cênica contemporânea;
- Propostas de montagens e desmontagens cênicas sobre a morte e a cena contemporânea;
- Questões epistemológicas, filosóficas e sociopolíticas envolvendo a temática da morte e a criação artística contemporânea;
- A morte, a ausência, o vazio como disparador de construção cênica;
- Discursos críticos que interseccionam a temática da morte com as artes cênicas;
- As visões da morte na recepção e análise de encenações contemporâneas;
- Mediações de ações artísticas relacionadas ao assunto da morte;
- Ações artístico-pedagógicas voltadas para o tema da morte;
- Arte e vida, morte e renascimento;
- Morte, memória e esquecimento;
- Morte, herança, legado e arquivos dos artistas da cena;
- Dramaturgia e escrita a partir da temática da morte;
- Rituais de morte, luto e performances culturais;
- O espaço para o luto na contemporaneidade;
- Diálogos com a cena e a construção cênica sobre os sentidos filosóficos da morte e seu potencial de renascimento;
- Visualidades, sonoplastias e outros campos da criação cênica na interface com o tema da morte;
- Experiências etnográficas em diálogo com a ação artística que reflitam sobre as perdas e ausências em diferentes contextos;
- Corpo, necropolítica e violência nas artes da cena.
A Revista Sala Preta recebe submissões de artigos, entrevistas, críticas, resenhas e traduções que se vinculem conceitualmente ao campo das artes da cena e da pedagogia das artes cênicas. Textos de todos esses tipos podem ser submetidos dentro da temática do Dossiê Quando o assunto é a morte, até 1 de outubro de 2022. Textos sobre outros assuntos podem ser submetidos dentro do fluxo contínuo da revista. Todas as produções textuais devem seguir as condições de submissão e diretrizes para autores, disponíveis em: https://www.revistas.usp.br/salapreta/about/submissions.
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OUTROS PRAZOS - textos que desejem ser considerados para o v.21 n.2 da revista (sem limitação de tema) devem ser encaminhados até 1/set. Textos que intencionem se integrar ao dossiê Quando o assunto é a morte, do v.22 n.1, podem ser submetidos até 1/out.
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