Casas, fazenda e fábrica: espaços de circulação e o conhecimento geográfico sobre o Brasil nas primeiras décadas do Oitocentos

Autores

DOI:

https://doi.org/10.11606/1982-02672024v32e30

Palavras-chave:

Viajantes, Conhecimento científico, História das ciências, História da Geografia, História da Cartografia

Resumo

Este artigo propõe uma reflexão acerca do problema da circulação do conhecimento geográfico nas três primeiras décadas do século XIX. Partindo do exemplo de quatro espaços de circulação, procurados amiúde por cientistas e homens de letras estrangeiros que visitaram o Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais, buscamos compreender o papel desses locais na produção e circulação do conhecimento geográfico antes mesmo da fundação do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (1838). Para tanto, centramos o foco de nossa análise nos registros das visitas de cientistas como os barões de Eschwege e de Langsdorff, por exemplo, bem como no papel desempenhado pelo engenheiro-militar luso-brasileiro, Daniel Pedro Müller, como anfitrião de alguns desses viajantes na então capitania de São Paulo. Recorremos a fontes diversas, como os relatos de viagens, a correspondência oficial da administração colonial, ensaios histórico-estatísticos e plantas e mapas geográficos que foram estudados pelos viajantes ou produzidos por eles a partir das informações levantadas no âmbito de suas visitas. É nosso objetivo, portanto, apontar para a emergência desses espaços de circulação em diferentes partes do país, onde os cientistas estrangeiros se deparavam com conhecimentos geográficos produzidos por um grupo lato de pessoas, cuja abrangência incluía engenheiros-militares, matemáticos e astrônomos, mas também sertanistas e as populações indígenas. A melhor compreensão desses espaços, assim como do modo como o conhecimento ali acessado pelos estrangeiros se reconfigurou para ser empregado em seus trabalhos, contribui para reforçar não só a natureza compartilhada do processo de produção de conhecimento, mas, principalmente, como este último se constitui a partir de incessantes movimentos de idas e vindas, aspectos significativos para uma percepção mais aprofundada da noção de autoria em trabalhos de natureza científica ou, mais especificamente, geográfica.

Downloads

Biografia do Autor

  • José Rogério Beier, Universidade de São Paulo. Museu Paulista

    É doutor em História Econômica e mestre em História Social, ambos os títulos conferidos pela FFLCH-USP. Atualmente desenvolve uma pesquisa de pós-doutoramento em História da Cartografia no Museu Paulista, com estágio na Osher Map Library na University of Southern Maine, financiada pela FAPESP, processo 2023/01143-1, a quem o autor aproveita a oportunidade para agradecer. E-mail: rogerio.beier@usp.br.

Referências

Fontes impressas

ALMEIDA, Candido Mendes de. Atlas do imperio do Brazil comprehendendo as respectivas divis?es administrativas, ecclesiasticas, eleitoraes e judiciarias dedicado a sua magestade o imperador o senhor D. Pedro II:destinado á instrucç?o publica no imperio com especialidade á dos alumnos do imperial collegio de Pedro II. Rio de Janeiro: Instituto Philomathico, 1868.

CARTA do governador e capitão general da capitania de São Paulo, Morgado de Mateus, d. Luís Antônio de Sousa Botelho Mourão, para o Conde de Oeiras [Sebastião José de Carvalho e Melo], dando conta da primeira expedição da Companhia de Aventureiros Paulistas para Viamão, e outros assuntos de guerra e militares. 30 mar. 1766. In: Documentos Interessantes para a História e Costumes de São Paulo. São Paulo: Gráfica João Bentivegna, 1952. v. 72.

ESCHWEGE, Wilhelm Ludwig von. Journal von Brasilien, oder Vermischte nachrichten aus Brasilien. Weimar: Im verlage des Gr. H.S. pr. S.l.: Landes-industries-comptoirs, 1817.

ESCHWEGE, Wilhelm Ludwig von. Brasil, novo mundo. Tradução Myriam Ávlila. Estudo Introdutório e Notras Friedrich E. Renger. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, 2001. v. II.

OLIVEIRA, José Joaquim Machado de. Quadro histórico da Província de São Paulo. São Paulo: Typographia Imparcial, 1864.

SPIX, Johann Baptiste von; MARTIUS, Carl Phillip von. Reise in Brasilien auf Befehl Sr. Majesta?t maximilian Joseph I. Ko?nigs von Baiern in den Jahren 1817 bis 1820. Mu?nchen: Lindauer, 1823.

SPIX, Johann Baptiste von; MARTIUS, Carl Phillip von. Travels in Brazil in the years 1817-1820. London: Longman, Hurst, Rees, Orme Brown and Green, 1824. v. 1.

Livros, artigos e teses

ALMEIDA, André Ferrand de. A formação do espaço brasileiro e o projeto do novo atlas da América portuguesa (1713-1748). Lisboa: Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, 2001. 208p.

BECHER, Hans. O Barão Georg Heinrich von Langsdorff: pesquisas de um cientista alemão no século XIX. Apresentação de Marcos Pinto Braga. Posfácio de Nicolau Sevcenko. Brasília: UnB, 1990.

BEIER, José Rogério; MARHTIN, Daniel. Aspectos da representação do território paulista em sua cartografia impressa: uma análise cartobibliográfica (1833-1932). Confins, v. 34, 2018. Disponível em: http://journals.openedition.org/confins/12809. Acesso em: 11 mar. 2020.

BEIER, José Rogério. Artefatos de poder: Daniel Pedro Müller, a Assembleia Legislativa e a construção territorial da província de São Paulo (1835-1849). 2015, 385 f. Dissertação (Mestrado em História Social) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2015.

BEIER, José Rogério. Caminhos para o Atlântico Sul: a reconfiguração do sistema de comunicações e de transportes em São Paulo durante a consolidação da economia açucareira (1788-1840). 2022. 354 f. Tese (Doutorado em História Econômica) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2022.

BEIER, José Rogério; CINTRA, Jorge Pimentel. O mapa da Capitania de São Paulo de Wilhelm Ludwig von Eschwege: uma análise cartográfica. In: SIMPÓSIO BRASILEIRO DE CARTOGRAFIA, 3, 2016. Anais.... Belo Horizonte: Centro de Referência em Cartografia Histórica, 2016. p. 227-237.

BERTELS, D. E.; KOMISSAROV, B. N; LICENKO, T. I. (org). A expedição científica de G. I. Langsdorff ao Brasil, 1821-1829. In: Catálogo completo do material existente nos arquivos da União Soviética. Brasília: MEC-SPHAN, 1981.

COHEN, Deborah; O'CONNOR, Maura (ed.). Comparison and history: Europe in cross-national perspective. New York: Routledge, 2004. p. ix-xxiv.

CONCEIÇÃO, Gisele Cristina da. Ciência, poder e circulação de conhecimento no século XVIII: Ribeiro Sanches e o Brasil colonial. Topoi, Rio de Janeiro, v. 20, n. 42, p. 818-841, 2019.

COSTA, Maria de Fátima. Le voyage de Langsdorff au Brésil: une aventure inachevée. In: NAGLER, Linda Fregni ; RAIMONDI, Cristiano (org.). Hercule Florence. le nouveau Robinson. Mônaco: Monaco National Musée Nouveau et Humboldt Books, 2017. v. 1, p. 196-242.

COSTA, Maria de Fátima; DIENER, Pablo. Bastidores da Expedição Langsdorff. Cuiabá: Entrelinhas, 2014. v. 1.

DEAECTO, Marisa Midori. O império dos livros: instituições e práticas de leitura na São Paulo oitocentista. São Paulo: Edusp/Fapesp, 2011.

ELDEN, Stuart. Land, terrain, territory. Progress In Human Geography, n. 34, v. 6, p. 799-817, 2010.

FURTADO, Júnia Ferreira. Oráculos da geografia iluminista: Dom Luís da Cunha e Jean-Baptiste Bourguignon D’Anville na construção da cartografia do Brasil. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2012.

GOULD, Elida H. Entangled histories, entangled worlds: the English-speaking Atlantic as a Spanish periphery. The American Historial Review, v. 112, issue 3, 2007.

HOLANDA, Sérgio Buarque de. A herança colonial: sua desagregação. In: História geral da civilização brasileira. 2ª ed. São Paulo: Difel, 1965. Tomo II, v. 1.

KANTOR, Iris. Esquecidos e renascidos: historiografia acadêmica luso-americana (1724-1759). São Paulo: Hucitec, 2004.

KANTOR, Iris. Cultura cartográfica e gestão territorial na época da instalação da corte portuguesa. In: KURY, Lorelai; GESTEIRA, Heloísa (org.). Ensaios de história das ciências no Brasil: das luzes à nação independente. Rio de Janeiro: Eduerj, 2012.

KOK, Glória. O sertão itinerante: expedições da capitania de São Paulo no século XVIII. São Paulo: Hucitec, 2004.

KOCKA, Jürgen. Comparison and beyond. History and Theory, v. 42, n. 1, 2003.

KOMISSARIOV, Boris. As relações diplomáticas e comerciais entre Rússia e Brasil na época de Langsdorff. In: SILVA, D. G. B. (org.) et al.

Os diários de Langsdorff [online]. Campinas: Associação Internacional de Estudos Langsdorff, 1997. v. 1. ISBN 85-86515-02-7.

KOMISSAROV, Boris. Langsdorff: com o Brasil, para sempre. In: Expedição Langsdorff. São Paulo: Centro Cultural Banco do Brasil, 2010. Catálogo de Exposição.

LACOSTE, Yves. A Geografia: isso serve em primeiro lugar, para fazer a guerra. Campinas: Papirus, 1988.

LISBOA, Karen Macknow. A Nova Atlântida de Spix e Martius: natureza e civilização na viagem pelo Brasil (1817-1820). São Paulo: Hucitec, 1997.

MARKOVITS, Claude; POUCHEPADASS, Jacques; SUBRAHMANYAM, Sanjay. Introduction. In: Society and circulation: mobile people and itinerant cultures in South Asia 1750-1950. Delhi: Permanent Black, 2003. p. 1-22.

MELO, Josemar Henrique de. Os acervos coloniais e os secretários de governo das capitanias: o início dos arquivos no Brasil. Ciência da Informação, Distrito Federal, v. 42, n. 1, p. 117-130, 2013. Disponível em: http://revista.ibict.br/ciinf/article/view/1399. Accesso em: 12 nov. 2021.

MORAES, Antonio Carlos Robert. Ideologias geográficas: espaço, cultura e política no Brasil. São Paulo: Hucitec, 1991.

MORAES, Rubens Borba de. A Impressão Régia do Rio de Janeiro: origens e produção. In: CAMARGO, Ana Maria de Almeida; MORAES, Rubens Borba de. Bibliografia da Impressão Régia do Rio de Janeiro. São Paulo: Edusp, 1993. v.1, p. XXIII-XXV.

MOURA, Denise A S de. Aos olhos da mulher indígena: cartografia, espacialidade e gênero em expedições de mapeamento no Brasil meridional (século XVIII). Nuevo Mundo Mundos Nuevos [Online], Debates, jun. 2022. Disponível em: http://journals.openedition.org/nuevomundo/88268. Acesso em: 05 out. 2023.

PUNTONI, Pedro. Bernardo Vieira Ravasco, secretário do Estado do Brasil: poder e elites na Bahia do século XVII. Novos Estudos Cebrap, São Paulo, n. 68, p. 107-126, 2004.

RAJ, Kapil. Networks of knowledge, or spaces of circulation? The birth of British cartography in colonial south Asia in the late eighteenth century. Global Intellectual History, vol. 2, n. 1, p. 49-66, 2017.

RAJ, Kapil. Relocating modern science: circulation and the construction of knowledge in South Asia and Europe, 1650–1900. Basingstoke: Palgrave Macmillan, 2007.

RENGER, Friedrich Renger. Resumo biográfico de Wilhelm Ludwig Barão Von Eschwege (1777-1855). In: Jornal do Brasil 1811-1817 ou Relatos diversos do Brasil, coletados durante expedições científicas. Notas introdutórias de Friedrich E. Renger e Douglas Cole Libby. Tradução Friedrich E. Renger; Tarcísia Lobo Ribeiro e Gu?nter Augustin. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, 2002. p. 391-397.

RODRIGUEZ, Julia. South Atlantic crossings: fingerprints, science, and the state in turn-of-thecentury Argentina. American Historical Review, v. 109, n. 2, p. 387–416, 2004.

SENRA Nelson. Informação estatística: forma de saber, fonte de poder. In: História das estatísticas brasileiras: estatísticas desejadas (1822-1889). Prefácio: Ronaldo Vainfas. Rio de Janeiro: IBGE, 2006. v.1

STRAUSS, Dieter. Der gru?ne Baron: Georg Heinrich von Langsdorff, der Humboldt Brasiliens, und seine Expedition von Rio de Janeiro zum Amazonas 1822-1829. Frankfurt am Main: Peter Lang, 2012. 140p.

SUBRAHMANYAM, Sanjay. Connected histories: notes towards a reconfiguration of early modern Eurasia. Modern Asian Studies, v. 31, n. 3, p. 735-762.

TOLEDO, Benedito Lima de. O Real Corpo de Engenheiros na Capitania de São Paulo destacando-se a obra do Brigadeiro João da Costa Ferreira. São Paulo: João Fortes Engenharia, 1981.

WERNER, Michael; ZIMMERMANN Bénédicte. Beyond comparison: histoire croisée and the challenge of reflexivity. History and Theory, v. 45, n. 1, p. 30-50, 2006.

Downloads

Publicado

2025-01-29

Edição

Seção

Estudos de Cultura Material

Dados de financiamento

Como Citar

BEIER, José Rogério. Casas, fazenda e fábrica: espaços de circulação e o conhecimento geográfico sobre o Brasil nas primeiras décadas do Oitocentos. Anais do Museu Paulista: História e Cultura Material, São Paulo, v. 32, p. 1–29, 2025. DOI: 10.11606/1982-02672024v32e30. Disponível em: https://periodicos.usp.br/anaismp/article/view/220962.. Acesso em: 1 abr. 2025.