Pele negra, jalecos brancos: racismo, cor(po) e (est)ética no trabalho de campo antropológico
DOI:
https://doi.org/10.11606/1678-9857.ra.2022.192796Palavras-chave:
Racismo, Corpo, Trabalho de campo, Ética, MedicinaResumo
Durante pesquisa de campo de doutorado, acompanhei o trabalho de algumas médicas brancas em suas atividades de condução de protocolos de pesquisa clínica. Minha presença nos consultórios foi condicionada ao uso de um jaleco branco, peça que, por vezes, colocou-me em posição de explicar aos pacientes que não era uma estagiária de medicina e, por outras, tornou explícitos os limites de confusões supostamente automáticas entre mim e uma profissional da medicina. Por meio de uma análise de situações de racismo genderificado que vivi durante o trabalho de campo enquanto vestia um jaleco, reflito sobre o campo da medicina como espaço marcado pela branquidade e, estendendo tal crítica à antropologia, argumento que a reflexão ética sobre a pesquisa de campo deve levar em conta, necessariamente, as hierarquizações raciais e de gênero que compõem as interações com interlocutores de pesquisa – em especial, as experimentadas por pesquisadoras negras em contextos nos quais a branquidade é normalizada.
Downloads
Referências
ALBUQUERQUE, Fabiane. 2017. “Meu corpo em campo: reflexões e desafios no trabalho etnográfico com imigrantes na Itália”. Cadernos de Campo, vol.26, n. 1: 309–326. DOI https://doi.org/10.11606/issn.2316-9133.v26i1p309-326
BECKER, Howard. 2008. Outsiders: estudos de sociologia do desvio. Rio de Janeiro, Jorge Zahar.
BENTO, Maria Aparecida. 2002. “Branqueamento e branquitude no Brasil”. In CARONE, Iray; BENTO, Maria Aparecida (org.). Psicologia Social do racismo. Petrópolis, Ed. Vozes, pp. 25–59.
BERNARDINO-COSTA, Joaze. 2016. A prece de Frantz Fanon: “Oh, meu corpo, faça de mim um homem que questiona!”. Civitas, vol. 16, n. 3: 504–521. DOI https://doi.org/10.15448/1984-7289.2016.3.22915.
CARDOSO DE OLIVEIRA, Luís Roberto. 2004. “Pesquisa em versus pesquisa com seres humanos”. In VÍCTORA, Ceres et.al. (Org.). Antropologia e Ética: o debate atual no Brasil. Niterói, EdUFF, pp. 33–44.
CARNEIRO, Aparecida Sueli. 2005. A construção do Outro como Não-Ser como fundamento do Ser. São Paulo, Tese de doutorado, Universidade de São Paulo.
CASTRO, Rosana. 2020. Economias políticas da doença e da saúde: uma etnografia da experimentação farmacêutica. São Paulo, Hucitec.
CHAZÁN, Lilian K. 2005. “Vestindo o jaleco: reflexões sobre a subjetividade e a posição do etnógrafo em ambiente médico”. Cadernos de Campo, v.13: 15–32. DOI https://doi.org/10.11606/issn.2316-9133.v13i13p%25p
COLLINS, Patricia Hill. 2016. “Aprendendo com a outsider within: a significação do pensamento feminista negro”. Sociedade e Estado, vol. 31, n.1: 99–127. DOI 10.1590/S0102-69922016000100006.
COLLINS, Patricia Hill. 2019. Pensamento Feminista Negro: conhecimento, consciência e a política do empoderamento. São Paulo, Boitempo.
DAMATTA, Roberto. 1978. O ofício do etnólogo ou como ter anthropological blues. Boletim do Museu Nacional, vol. 27: 1–12.
DAMACENO, Janaína. 2013. Os segredos de Virgínia: estudo das atitudes raciais em São Paulo (1945-1955). São Paulo, Tese de doutorado, Universidade de São Paulo.
DUARTE, Luiz Fernando Dias. 1998. “Investigação antropológica sobre doença, sofrimento e perturbação: uma introdução”. In DUARTE, Luiz Fernando Dias; LEAL, Ondina Fachel. (org.). Doença, sofrimento, perturbação: perspectivas etnográficas. Rio de Janeiro, Fiocruz, pp. 9–27.
FANON, Frantz. 1965. A Dying Colonialism. New York, Grove Press.
FANON, Frantz. 2008. Pele negra, máscaras brancas. Salvador, EDUFBA.
G1. 2013. “Jornalista diz que médicas cubanas parecem “empregadas domésticas”. Portal G1. Disponível em: <http://g1.globo.com/rn/rio-grande-do-norte/noticia/2013/08/jornalista-diz-que-medicas-cubanas-parecem-empregadas-domesticas.html>. Acesso em: 17 de junho de 2020.
GOMES, Edlaine; MENEZES, Rachel. 2008. Etnografias possíveis: “estar” ou “ser” de dentro. Ponto Urbe n.3. DOI 10.4000/pontourbe.1748.
GOMES, Luciano B.; MEHRY, Emerson. 2017. Uma análise da luta das entidades médicas brasileiras diante do Programa Mais Médicos. Interface (Botucatu), vol. 21, -Suplemento 1: 1103–14. DOI https://doi.org/10.1590/1807-57622016.0363.
GONÇALVES, Mônica Mendes. 2017. Raça e saúde: concepções, antítese e antinomia na Atenção Básica. São Paulo, Dissertação de mestrado, Universidade de São Paulo.
GONZALEZ, Lélia. 1983. Racismo e sexismo na cultura brasileira. Ciências Sociais Hoje - ANPOCS, vol. 2: 223–244.
JESUS, Rebecca Amorim et.al. 2017. Programa Mais Médicos: análise documental dos eventos críticos e posicionamentos dos atores sociais. Interface (Botucatu), vol. 21, Suplemento 1: 1241–55. DOI https://doi.org/10.1590/1807-57622016.0555.
KILOMBA, Grada. 2019. Memórias da plantação - Episódios de racismo cotidiano. Rio de Janeiro, Cobogó.
KRENSHAW, Kimberlé. 2002. “Documento para o encontro de especialistas em aspectos da discriminação racial relativos ao gênero”. Estudos Feministas, (10): 171–188. DOI https://doi.org/10.1590/S0104-026X2002000100011.
LIMA, Silvio Cezar de Sousa. 2011. O corpo escravo como objeto das práticas médicas no Rio de Janeiro (1830-1850). Rio de Janeiro, Tese de doutorado, Fundação Oswaldo Cruz.
MBEMBE, Achille. 2014. Crítica da razão negra. Lisboa, Antígona.
MEDEIROS, Flávia. 2017. Adversidades e lugares de fala na produção do conhecimento etnográfico com policiais civis. Cadernos de Campo, vol. 26, n.1: 327–347. DOI https://doi.org/10.11606/issn.2316-9133.v26i1p327-347
MENEZES, Rachel. 2004. Em busca da “boa morte”: uma investigação sócio-antropológica sobre cuidados paliativos. Rio de Janeiro, Tese de doutorado, Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
MORRISON, Toni. 2020. “Racismo e fascismo & O corpo escravizado e o corpo negro”. In: MORRISON, Toni. A fonte da autoestima. São Paulo, Companhia das Letras.
NASCIMENTO, Aline Maia; CRUZ, Bárbara Pimentel da Silva. 2017. “Apresentação - reflexões a partir da experiência do Museu Nacional”. Revista de Antropologia, vol. 60, n.1: 9-15. DOI https://doi.org/10.11606/2179-0892.ra.2017.132057.
PATERNIANI, Stella Zagatto. 2016. A branquidade do Estado na ocupação da cidade. Revista Brasileira de Ciências Sociais, vol. 31, n. 91: e319109. DOI https://doi.org/10.17666/319109/2016.
PEREIRA, Bruna. 2018. Amefricanas: branqueamento, gênero e raça. Cadernos Adenauer, vol. XIX, n.1: 177–188.
PEREIRA, Luena. 2020. Alteridade e raça entre África e Brasil - branquidade e descentramentos nas ciências sociais brasileiras. Revista de Antropologia, vol.63, n.2: e170727. DOI https://doi.org/10.11606/2179-0892.ra.2020.170727.
SARTI, Cynthia. 2010. “Saúde e Sofrimento”. In: MARTINS, Carlos B.; DUARTE, Luiz Fernando Dias. (Orgs.). Horizontes das Ciências Sociais no Brasil: Antropologia. São Paulo, ANPOCS, pp. 197–223.
SCHEFFER, Mário et.al. 2018. Demografia Médica do Brasil 2018. São Paulo, FMUSP, CFM, Cremesp.
SCHEFFER, Mário et. al. 2020. Demografia Médica no Brasil 2020. São Paulo, FMUSP, CFM.
WASHINGTON, Harriet. 2006. Medical Apartheid: The dark history of medical experimentation on black Americans from colonial times to the present. New York, Harlem Moon e Broadway Books.
Downloads
Publicado
Edição
Seção
Licença
Copyright (c) 2022 Revista de Antropologia
Este trabalho está licenciado sob uma licença Creative Commons Attribution 4.0 International License.
Autores que publicam na Revista de Antropologia concordam com os seguintes termos:
a) Autores mantém os direitos autorais e concedem à revista o direito de primeira publicação, com o trabalho simultaneamente licenciado sob a Licença Creative Commons Attribution que permite o compartilhamento do trabalho com reconhecimento da autoria e publicação inicial nesta revista.
b) Autores têm autorização para assumir contratos adicionais separadamente, para distribuição não-exclusiva da versão do trabalho publicada nesta revista (ex.: publicar em repositório institucional ou como capítulo de livro), com reconhecimento de autoria e publicação inicial nesta revista.
c) Autores têm permissão e são estimulados a publicar e distribuir seu trabalho online (ex.: em repositórios institucionais ou na sua página pessoal) após o processo editorial, já que isso pode gerar alterações produtivas, bem como aumentar o impacto e a citação do trabalho publicado (Veja O Efeito do Acesso Livre).